35 Anos da Fundação Portuguesa de Cardiologia: Mensagem do Senhor Presidente

 

As doenças cardiovasculares são o maior problema de saúde pública, em Portugal.

 

prof.-248x300A Fundação Portuguesa de Cardiologia é uma Instituição de Utilidade Pública, de âmbito nacional, que visa fomentar a prevenção das doenças cardiovasculares e a promoção da saúde. A FPC foi constituída, por escritura notarial, no já distante dia 7 de Novembro de 1979, tendo como subscritores o Professor Fernando de Pádua, o Professor Carlos Ribeiro e o Dr. Pena de Carvalho, ilustres cardiologistas.

 

A FPC vive do trabalho de voluntários e da generosidade de mecenas, quer particulares quer empresas, dado que a FPC, sempre optou por não ter atividades comerciais, vivendo, numa palavra, de boas vontades.

 

Hoje a Fundação está estabelecida em todo o País, com delegações e núcleos, implantados não só no continente como nas regiões autónomas, com equipas de profissionais de saúde e personalidades não médicas de relevo da sociedade portuguesa, a trabalhar lado a lado, em plano de igualdade.

 

O seu trabalho benévolo conjunto conseguiu ao longo de mais de três décadas, conquistar o reconhecimento e a generosidade da população portuguesa, o que certamente foi tido em conta, tanto pela Presidência da República, como pelo Ministério da Saúde, ao concederem recentemente as mais altas distinções oficiais à Fundação.

 

Tal foi possível graças ao trabalho de continuidade das diferentes Direções da Fundação Portuguesa de Cardiologia dirigidas sucessivamente pelo Professor Fernando de Pádua, Professor Salomão Sequerra Amram e Professor Manuel Carrageta. Este último tem tido o privilégio de contar com as importantes contribuições da Delegação Norte, da Delegação Centro, da Delegação da Madeira e da Delegação do Algarve, dirigidas respetivamente pelos Professor João Lopes Gomes, Professor Polybio Serra e Silva, Dr. Almada Cardoso e Professor José Coucello, bem como dos voluntários dos diversos Núcleos que cobrem todo o País.

 

A importância das doenças cardiovasculares é enorme, se tivermos em conta, que em Portugal, só no último ano, de um total de 100.000 óbitos, ocorreram cerca de 35000 mortes por doenças cardiovasculares, das quais se estima que cerca de 20.000 sejam devidas a acidente cerebrovascular e mais de 10000 a enfarte do miocárdio.

 

A tendência dos últimos anos mostra uma ligeira redução dos acidentes vasculares cerebrais e dos enfartes do miocárdio fatais, para a qual contribuiu certamente o trabalho da Fundação. No seu conjunto, as doenças cardiovasculares são responsáveis por mais de um terço de toda a mortalidade da população portuguesa.

 

Nos últimos anos, a Fundação dedicou grande atenção à dieta mediterrânica, que é considerada uma das mais saudáveis do mundo, o que é testemunhado pelo facto dos habitantes da Europa do Sul, entre os quais de Portugal, terem a mais baixa taxa de mortalidade por doenças cardíacas da Europa.

 

O seu extraordinário valor foi realçado pela primeira vez por Ancel Keys, um médico de Harvard, que observou existir, num estudo realizado em diversos países, uma estreita relação entre o consumo de gorduras e a incidência de doença coronária, sendo esta doença tanto mais frequente quanto mais elevado fosse o consumo de gordura. A exceção verificou-se apenas nos povos da bacia do Mediterrâneo que, apesar de terem um elevado consumo de gordura, sofriam de relativamente poucos enfartes do miocárdio. A exceção residia na grande diferença no tipo de gordura consumida que, no Mediterrâneo, era sobretudo gordura insaturada (azeite).

 

O azeite, rico em ácido gordo monoinsaturado, reduz os níveis de colesterol e, apesar das calorias extra que implicam a ingestão de qualquer gordura, o seu consumo não parece estar associado a excesso de peso e obesidade. O melhor azeite é o virgem extra, assim chamado por ser obtido pela primeira extração/prensagem mecânica a frio a que são submetidas as azeitonas. A cor verde escura que apresenta é devida à riqueza em antioxidantes, que se perdem parcialmente nos processos de refinação, branqueamento ou de obtenção do azeite por métodos de aquecimento.

 

Esta dieta é ainda rica em vegetais e fruta, pão de trigo ou outros cereais pouco refinados e peixe, sendo pobre em gorduras saturadas, da carne e dos lacticínios, e rica em gordura monoinsaturada (azeite), ácidos gordos ómega 3 (peixe) e fibra alimentar.

 

Os povos do Mediterrâneo consomem vinho tinto, em quantidades moderadas, às refeições, ao contrário dos povos do Mar do Norte e da Europa Oriental, que bebem quantidades intoxicantes de cerveja e bebidas espirituosas aos fins-de-semana. Por outro lado, os flavonóides do vinho tinto com a sua poderosa ação antioxidante também contribuem para uma melhor saúde cardiovascular.

 

É evidente que parte dos benefícios atribuídos a esta alimentação são também certamente devidos a outros fatores, nomeadamente culturais, como o menor uso do automóvel, mais deslocações a pé, o que significa maior atividade física, bem como a uma atmosfera social mais descontraída e efetiva que caracteriza a vida dos povos mediterrânicos, pelo que se deverá falar, não apenas de dieta mediterrânica, mas antes com toda a propriedade em cultura mediterrânica.

 

Com a aprovação da dieta mediterrânica portuguesa como património mundial da humanidade pela Unesco, processo em qual os esforços desenvolvidos pela Fundação Portuguesa de Cardiologia foram fundamentais, não só na sensibilização inicial da comunidade e dos poderes públicos, mas também pelo contributo empenhado no desenvolvimento do processo de candidatura.

 

À luz dos conhecimentos científicos atuais torna-se cada vez mais fácil persuadir o Governo e a comunidade em geral para a importância da prevenção cardiovascular. Gastar dinheiro em prevenção deve ser cada vez mais percebido não como uma despesa mas antes como um investimento altamente rentável.

 

Sem dúvida que a prevenção é um dos caminhos pelo qual o SNS deverá enveredar, não só para evitar o sofrimento humano causado pela doença, como para reduzir os custos crescentes das novas tecnologias que desequilibram o orçamento da saúde.

 

No momento, em que o nosso Serviço Nacional de Saúde enfrenta grandes dificuldades de financiamento, não podemos deixar de lembrar que é indispensável dar toda a ênfase aos cuidados preventivos, baseados nomeadamente na área da medicina familiar, que deverá constituir a parte nuclear do nosso Sistema de Saúde. De outro modo, o sistema inclinar-se-á cada vez mais para os cuidados secundários, com o uso e até o risco de abuso das novas e dispendiosas, embora indispensáveis tecnologias, que podem, numa época de profunda crise económica, conduzir a uma política indesejável de contenção e até racionamento de custos.

 

Segundo a OMS cada indivíduo deve participar nas decisões que lhe dizem respeito, tornando-se deste modo responsável pela sua própria saúde. Face à situação atual, por ocasião da passagem do seu aniversário, a FPC apela a que todos coloquem a sua saúde, nas prioridades da sua vida pessoal, adotando estilos de vida saudáveis. Só deste modo será possível alcançar o importante objetivo de melhorar a saúde e qualidade de vida dos nossos concidadãos.

 

Prof. Doutor Manuel Oliveira Carrageta

Presidente da Fundação Portuguesa de Cardiologia