Maio – Mês do Coração

As doenças cardiovasculares são a principal causa de morte em Portugal, sendo responsáveis por mais de um terço da mortalidade total. Não podemos ignorar que antes da pandemia da Covid -19 morriam cerca de 100 pessoas por dia (o número anual médio de mortos nos últimos 5 anos foi superior a trinta e três mil óbitos), devido a patologia cardiovascular. A tendência dos últimos anos mostra uma progressiva redução da mortalidade, sobretudo, devida a acidentes vasculares cerebrais, menos a enfartes do miocárdio e, pelo contrário, um aumento dos casos de insuficiência cardíaca e de fibrilhação auricular.

Neste primeiro ano da pandemia viral, o número de mortes por doença cardiovascular voltou a crescer, contribuindo para o significativo aumento de mortes não-Covid, certamente motivado pelo cancelamento e adiamento de consultas, tratamentos e internamentos, quer por iniciativa dos próprios doentes quer pelas unidades de saúde.

Os doentes cardíacos não vacinados estão em muito maior risco de desenvolver doença grave com necessidade de hospitalização e até de morte. Por outras palavras, as doenças cardiovasculares são um fator de risco importante para o desenvolvimento de complicações graves para esta nova causa de morte: a Covid-19. Até ao momento nos doentes cardíacos, não tem surgido aumento de complicações após a vacinação, mesmo nos doentes mais frágeis com insuficiência cardíaca, uma das formas mais graves de doença cardiovascular. Por estes motivos, a Fundação sempre defendeu que os doentes cardiovasculares devem ser vacinados prioritariamente.

Este ano, a Fundação dedica o Mês de Maio ao Coração à atividade física, como forma de ter um “Coração em Forma”, tendo em atenção que os portugueses são o povo da União Europeia que se destaca em todos os inquéritos por ser aquele que menos atividade física pratica.

No tempo dos nossos avós, poucos frequentavam ginásios ou faziam marchas diárias nos tempos livres, mas muitos tinham uma vida ativa preenchida pelas atividades diárias da sua profissão, em que, nomeadamente, os trabalhos agrícolas exigiam o desenvolvimento de esforço físico considerável.

O progresso tecnológico, com o advento da automação, do computador e dos transportes, mudou o estilo de vida das populações que se tornaram sedentárias e passam o dia sentadas a trabalhar ou mesmo a assistir a espetáculos. Os tempos livres das crianças e dos jovens, em vez de serem direcionados para as brincadeiras da sua idade, atividades desportivas e de ar livre, são passados à frente do computador ou da televisão. Este componente do estilo de vida dado à passividade é um dos principais responsáveis pela epidemia de obesidade infantil que grassa no nosso país.

Devemos ter presente que a inatividade física é uma das mais importantes causas de doença e de morte no mundo moderno. Em contrapartida a atividade física regular (exercício físico) ajuda a controlar o peso e aumenta a “saúde” do aparelho cardiovascular, dos pulmões e do aparelho músculo-esquelético.

Costuma mesmo dizer-se que se os benefícios do exercício pudessem ser adquiridos sob a forma de comprimidos seria certamente o medicamento mais consumido de todos os tempos.

A atividade física regular reduz o risco de ataques cardíacos em mais de 30%, um benefício que pode ser comparável, por exemplo, ao obtido com a terapêutica redutora do colesterol. Por outro lado, a inatividade física confere um risco semelhante ao da obesidade e do tabagismo.

A atividade física é uma das medidas que aumenta o colesterol das HDL. É conhecida a relação inversa entre os níveis do colesterol das HDL e o risco de doença cardiovascular, ou seja, quanto maiores forem os níveis das HDL menor será o risco de ataque cardíaco.

A atividade física regular é uma das melhores maneiras de descer a tensão arterial, particularmente visível em indivíduos com tensão arterial pouco elevada. Em média, a prática regular de atividade física aeróbica reduz a tensão arterial sistólica, em cerca de 10 mmHg e a diastólica em 5 mmHg, o que é suficiente para normalizar os valores da tensão arterial em grande número de indivíduos com tensões ligeiramente elevadas.

Em muitos indivíduos, o excesso de peso e obesidade devem-se mais à inatividade física do que aos excessos alimentares. Como é sabido, por exemplo, andar a pé cerca de um quilómetro e meio queima à volta de 100 calorias. O ganho ou perda de um kg de peso corporal equivale a aproximadamente 7000 calorias. Isto significa que basta um ligeiro défice alimentar de 100 calorias por dia ou um esforço extra também diário de 100 calorias para que, ao fim de pouco mais de dois meses, se perder um kg de peso corporal.

A atividade física aumenta a sensibilidade dos tecidos periféricos à insulina, o que melhora o metabolismo da glicose, ajudando deste modo a prevenir a diabetes.

Vários estudos demonstram que a atividade física diminui a ansiedade e a depressão, promovendo a sensação de bem-estar e a saúde mental.

Está hoje claramente provado que a atividade física retarda o processo de envelhecimento, sendo atualmente uma das poucas medidas eficazes, a par com uma alimentação moderada (restrição calórica), a propiciar um aumento não só da longevidade como da qualidade de vida.

Estima-se que, em média, a uma hora de atividade física corresponde a um ganho de duas horas de aumento da esperança de vida.

À luz dos conhecimentos científicos atuais é cada vez mais fácil persuadir os Governos e a comunidade em geral para a importância da prevenção cardiovascular. Gastar dinheiro em prevenção deve ser cada vez mais percebido não como uma despesa mas antes como um investimento altamente rentável.

Este Mês de Maio a Fundação Portuguesa de Cardiologia recomenda a todos os cidadãos a prática de atividade física de intensidade moderada meia hora por dia, pelo menos cinco dias por semana, para reduzir o risco de doença cardíaca. Basta para isso, nomeadamente, andar em passo rápido meia hora a pé por dia.

Outra mensagem final em tempos de pandemia Covid-19 é a de que se deve ser vacinado o mais cedo possível, não importa qual seja a vacina, visto que todas são muito eficazes e seguras. Esta é a melhor maneira de se proteger a si e à sua família, a fim de todos podermos voltar, num futuro próximo, a ter alguma normalidade nas nossas vidas. Por último, saliente-se que, por enquanto, a vacinação não dispensa o distanciamento social, o uso de máscara, evitar reuniões em espaços fechados e a higiene das mãos.

 

Lisboa, Maio de 2021

 

Prof. Doutor Manuel Oliveira Carrageta

Presidente da Fundação Portuguesa de Cardiologia